Sobre a(s) Figura(s) Divina(s)

Deus. Deuses. Em capitais apenas por principiarem sentenças, refiro-me às figuras divinas às quais a humanidade recorre ininterruptamente em desespero solene.

Ícones diminuídos, já não onipotentes, representativas dos limites cognitivos conhecidos. Explico: séculos atrás, milênios, os deuses responsáveis por tudo eram. Deuses da chuva, da colheita, do sexo, do amor, deuses parciais, deuses supremos. Desde os primórdios são eles os baluartes do desconhecido, do inexplicado, da preguiça mental.

Mentes inquietas, insatisfeitas empurraram e derrubaram dogmas avançando nos mais diversos campos das ciências naturais a partir dos primeiros desenvolvimentos da filosofia organizada como manifesto social. A infantilidade sublime de perguntar "mas por quê?" e de não aceitar a explicação mais fácil, mais poética, mais promissora. A vontade de saber, de aprender e gerar conhecimento é também a busca infindável pelo desalento, pela materialidade da vida. Em poucas décadas descobrimos que a epilepsia não é a tomada do corpo e da alma pelos demônios, que carregamos uma carga genética de nossos ancestrais que determina em grande parte nosso fenótipo, que o Universo é uma macro-estrutura em estabilidade dinâmica e quiçá não-duradoura, que a chuva é influenciada por eventos múltiplos na atmosfera e não se trata de uma dádiva por bom comportamento. Enfim, avançamos no conhecer e deus ou os deuses perdem espaço em seu poder explicativo.

Mas há ainda um longo caminho a percorrer antes que esta figura seja tão ínfima a ponto de ser tratada como um fato histórico ridicularizado pelas civilizações vindouras como uma crendice de povos ignorantes. Que empáfia reconhecer a inexistência de Thor, Afrodite, Júpiter e compactuar com a noção de um (uns) ser (es) supostamente maiores e em objetivos maiores. Empáfia maior esta lógica medieval de manter o homem no centro do universo não mais físico, mas espiritual. Somos a imagem e a semelhança de tudo aquilo que rege o cosmos? Cultuamos uma imagem crucificada em nosso minúsculo planeta como se fosse a representação suprema da vida em todas suas formas e em todo o espaço em expansão.

Não pode ser tão difícil aceitar o quão insólita é a religião em todas suas formas. Em busca da esperança? Eu fico com a ciência. Me abstenho da esperança em busca da verdade.

Comentários

Anônimo disse…
Eu conheço UM DEUS. Já toquei nele. Ele tem cheiro até (meio azedo, dependendo do momento). Suas iniciais: BBF. Inclusive já tive o PRAZER de perder pra ele numa partida de tênis por 6x0. Bala, perdi pra um DEUS. Sim, ele existe.
Luciano Pyw disse…
Apesar de eu achar que discutir religião é coisa de 80 anos atrás, o esquema tá lúcido, eloquente e bem escrito, as usual.
Anônimo disse…
proibiram "bodies: the exhibition" na italia, ouvi dizer. maldita igreja catolica. mas pelo menos nenhum catolico sai por ai cortando gargantas de nao-catolicos, como fizeram com o van gogh na holanda (o theo, obviamente. its googlable)

mas, enfim, nenhum sentido. fui la hoje, é um bando de chines pelado e cortado em pedacinhos.

bbf, larga o cigarrillo. vi uns 287 pedacos de pulmoes de fumantes, hoje. tudo chines, claro, mas pulmao é pulmao.

yo, patria,
mateus,
creacionista.
Anônimo disse…
cada vez melhor.... que tino!
Eu, que jazz(o) aqui soterrada sob o extinto Muro, li a carta que escreveste aos 90 anos de idade, e ali já se desenhava a oposição às
divindades.Fazias caretas para deus.

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